Leia aqui um poema de "o escuro do céu é apenas uma ilusão de ótica", de Cristiane Dias:
As conversadeiras ou Esboços da Natureza
Impossível ouvir o que falam.
De longe, o silêncio.
Três mulheres:
Não sou uma delas.
Teatral é a
escultura de seus corpos,
inclinados,
curiosos.
Úmida, ainda vive
a vontade de tocar
a vida,
tagarela.
Corpos arqueiam, bocas animam.
Psiu:
Confidencial.
*
Mais perto. Este
proceder é invulgar.
Um canto íntimo
revela a conversadeira:
O sol esquenta a sua pele, cores vibram,
conchas se retraem,
a sua boca abre
e as outras ouvem
também com seus
segredos.
Preciso saber,
eu preciso.
Incontrolável o desejo
de
prender a respiração
(descer mais um pouco)
o som vem de outro lugar
da luz quando a pele toca
e conversa
a fim de sentir
o que é estar do lado de dentro.
Aproximo-me
as ondas voltam,
intranquilas.
Mergulho outra vez
e em torno delas
a onda também passa,
a vida inteira tentando ouvir
o segredo deles.
Dos corpos.
De sua invenção.
Aproximo-me mais:
chiado ricocheteia ...
- De perto, toda a verdade é monstruosa.
Psiu...
O sal deste mar queima os meus olhos,
o mar e sua água me invadem
os ouvidos,
uma grande onda cairá sobre mim
“Abrace esta palavra” – e “ouça este poema”:
solto minha tinta pelas águas, não recuso o movimento do disfarce.
Eu finjo ouvir o que elas ouvem:
preciso capturar a luz e colorir-me,
bisbilhoteira.
o escuro do céu é apenas uma ilusão de ótica, de cristiane dias
Natural de Florianópolis, Cristiane Dias trabalha como professora de Literatura em São Paulo . Seus estudos na Espanha - durante o doutorado e pós-doutorado em poesia - introduziu-a ao mundo místico e barroco de poetas como Santa Teresa D´Ávila e São João da Cruz. Além do mais, mantém uma leve obsessão pelos mitos gregos. Por fim, retomando a herança da poesia moderna, resgata a dicção do estranhamento como reinvenção do mundo através da palavra.