Leia aqui um poema de "próxima estação", de Felipe Crespo:
verão
o sol morrendo
nas costas
do cristo art déco
sinal enguiçado no vermelho
abertos (até quando?)
os braços
apontam
as veias do rio
horário de pico
via expressa
antifluxo
em câmera lenta
jesus guarda
municipal
reorganiza o tráfego
lá de cima
mas não sobra
espaço pra camelo nenhum
passar sob as corcovas
do morro
linha amarela ferida
presidente vargas protesta
caminhão da friboi
virado na av. brasil
garante o churrasco da galera
domingo regado à carne de primeira
cariocas entalados
em garrafinhas de 200ml
mininavios doidos
pra escapar
do gargalo
estão sempre voltando pra casa
o metrô no horizonte
é miragem
ouro de tolo
oásis lotado
uallace aguarda a vez
de ser engolido sem dó
olha o relógio: 20h30
parece que mais cedo
foi há 20 anos
mal sabe quando deixou
a barba crescer
tem medo da mulher
esquecer seu rosto
em casa pâmela
– fábrica de uma –
tenta não dormir
hoje precisa
encontrar o marido
dar boa noite
costura uniformes
na singer herdada da mãe
mesma cor mesmo corte
quase a mesma mão
de 10 a 12 horas por dia
pequenas empresas
grandes esforços
próxima estação, de felipe crespo
Felipe Crespo nasceu em 1986. É carioca, cria de Vicente de Carvalho (bairro da Zona Norte e estação da linha 2 do metrô), além de torcedor do Fluminense. Mestre em Literatura Brasileira pela UERJ, já foi orientador educacional do Colégio Pedro II, em Realengo. Atualmente, é servidor público da Universidade Federal Fluminense. Mora em Niterói desde 2020. Quando ainda morava na sua cidade, pegava trem e metrô dia sim, dia também.