Leia aqui um trecho de "diário contra a solidão", de Alfredo Guimarães Garcia:
Quinta-feira
Vocês repararam que as coisas evoluíram? Claro que repararam! De repente, não mais que de repente, a gente cresce, perde medos dos quais hoje deve achar uma bobagem nos irmãos e irmãzinhas, mas ganha outros.
Acho que esse é um dos segredos da vida: crescer é avançar no tempo e abandonar medos do passado, no entanto ganhar novos medos também.
É como uma travessia, percebem? Deste lado ficam nossos medos mais remotos, aqueles que achamos que seriam eternos. Do lado de lá, incógnitos, novos medos.
Sexta-feira
Só quem não está nem aí para a vida, acha que tudo é gratuito nas 24 horas de existência medida que usufrui diariamente, só esse não tem medos – ou acha que não os possui. Pois que o medo é algo nascidos da própria vida, é com ele que nascemos, com ele crescemos e chegamos ao fim da existência.
Por falar em medo, eu raspei esse trecho de um texto de meu pai –será que algum dia o “velho” vai me cobrar direitos autorais por causa disso, gente? – e dou de bandeja para vocês. Apreciem, é biscoito fino.
É o medo que faz o herói sobrepujar a covardia e realizar o ato heroico.
É o medo de romper os universos e descobrir que pode estar só que faz o homem tentar chegar até a lua e outros planetas.
É o medo de ficar só que faz o homem inventar canções, poemas, livros, telas, para ir ao encontro de outrem.
O medo é a argamassa da construção do futuro.
O medo que medra como limo na pedra.
O medo que se lavra nas ruas onde caminhamos.
diário contra a solidão, de alfredo guimarães garcia
ALFREDO GUIMARÃES GARCIA é o nome literário de Joaquim Alfredo Guimarães Garcia, paraense nascido em Bragança em 1961. Já publicou mais de 60 livros. É bacharel em Comunicação Social, especialista em Teoria Literária e Gestão Cultural pelo Senac (SP), além de Mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Alguns livros publicados: “O homem pelo avesso” (1993), “Memórias do Quintal” (1995), “O livro de Eros” (1998), “Impossível Chão” (2013), “O homem que falava com Deus” (2021); “Memórias de Meninos e Meninas” (2023), de contos; “Primeira Pessoa e outros poemas” (1996), “Frutos Diáfanos” (2014), “Os dias e outros poemas” (2017) e “Cordame” (2022), de poesia; “Enquanto meu pai morre” (2019), “Fiapo” (2021) e “Fragmentário” (2022), romances.
Em 2025, celebrando 40 anos de Literatura (1985), lançou os seguintes livros: “A Inquietante Gênese do Nada” (Romance, Letra Selvagem), “Afrocantos e outros poemas antirracistas” (Poesia, Populivros) e “Quem roubou o igarapé?” (Infantil, Editora Peteca).

