Leia aqui um poema de ". inferno capital", de Cau Ferreira:
. macho
a princípio
fazer o que é propício
livre negócio
livre excesso
free free free
fidelidade ao desejo sem tempo pra afeto
nada prende a quem se julga bicho solto
o novo velho macho é discurso ávido
sem tato
, sem tempo pra gente “emocionada”
tudo é eu eu eu
teu corpo meu meu meu
egoísmo em pele de cordeiro
capitalizando as graças ao seu redor
mastigando seu goZo sobre a posse
poliamor(?) sem amor, sem contexto
, sem paladar
quer a carne é só dÁ osso
quer a sopa e não dÁ caldo
quer a luz sem a cor da trOca
fala, fala, floreia
a liberdade que quer é a mesma que poda
a v a n ç a feliz o algoz
sobre a força de poder tomAr
patriarca vislumbrante
pai do semêm abandonado
nunca soube o que é cuidar
. a telha
torta, furada do tempo
traqueja o absurdo de não poder ser o que se é
e proteger
costas quentes e acostumadas, salivando na chuva
pin
g
A
e belisca o
chão
arisca de manhã
nem querendo resiste aos furos que lhe passam
em sol maior, numa luz amarela (como ela)
; carcomida pelo tempo
vento passa, passa
passeia
vento passa, pássaro
poesia, areia, areia
passa, passa e asseia
ora macio, ora tormento
alargando os cacos
confetinando fuligens
nesse naipe, lhe tomam por problema
e a trocam
dita sem função a nomeiam entulho; um troço
triste, se amargando de ódio, muitas ainda seria
: caco-memória de um povo
, arte-detalhe de quadro
, pedaço estiloso num vaso
, grande atração de leilão
partiu-se por se pôr na vida
, fizeram do seu destino-retalho uma porção de mais-valia
, superfaturada em crédito, débito, cripto
, em notas trancafiadas em malas
, em barras de ouro suado e sangrado em minas africanas
pobre, miserável, um dado da indústria construtora
demolida pelas horas de trabalho
só queria cumprir sua função
e ser cuidado
. inferno capital, de cau ferreira
Cau Ferreira é filho de migrantes pernambucanos e reside na periferia de São Paulo, onde leciona História e escreve poesia. Participou de antologias nacionais e é autor de . quando viver for repartir (TAUP). Especialista em Educação e Direitos Humanos pela UFABC, anseia por um mundo onde possa repartir pão, poesia, afeto e a sede saciada de justiça.

