Leia aqui um poema de "mergulho", de Cláudia Zulmira:
Do que sou feita
Metade vem do sertanejo, forte e resistente
Sergipano que veio para a Bahia
Se encantou pela tez morena das mulheres da terra de Gabriela
A outra vem da timidez, do labor e simpatia do povo ilhéu
Memória indígena impressa na minha pele
Lembrança da feira aos sábados
Cacarejo de galinha pendurada pelos pés
Tomate escorregado de leve para a bolsinha de criança
Travessura perdoada pela pureza da comidinha de faz-de-conta
Brincadeiras de infância:
Minhas irmãs, meu irmão, primas, primos, amigas,
Eduardo, Flavinho e Tuquinha já partiram
Férias na praia e na fazenda
O cheiro do cacau, o banho de mar
As festas de São João, o forró na casa dos vaqueiros
Para os carneirinhos rejeitados, leite na mamadeira
Alagoinhas: procissão de Ramos
Caruru de Cosme e Damião e Santa Bárbara
Micareta, e missa aos domingos
De minha mãe, o gosto pela leitura
A música, com meu pai
Quanta coisa boa, meu Deus
Assim fui me tornando
Daí vem o gosto pelo simples
A vida me dando mais
Namoro, machismo
A descoberta de Ser Mulher Maria da Penha
Tudo escondido
Salvador
Cidade da magia narrada nos livros de Jorge Amado
A emoção ao subir pela primeira vez a Ladeira da Montanha
Imaginando o correr dos Capitães da Areia.
Mar Morto, cheio de amores
A descoberta de um outro jeito de ser
Distante do machismo do interior
O susto por poder se expressar
Não esconder os feitos
Querer ser assim
Os amigos, a descoberta de um mundo cultural:
Pelourinho, ICBA, Vila Velha e o Palácio da Aclamação
A tortura de não enxergar um horizonte
Depois veio São Paulo e novos desafios
Mudanças de rumo, desencanar e assumir novas posturas
Luís, meu companheiro, expansão
Goiás, terra encrespada, crescimento a ferro e fogo
Contração
Maternidade: Luana, Camilla e Caio, meus amores
Pirenópolis, aconchego
Fé, menina! Libertação
Peraí, minha Santa Terezinha!
Novo movimento, sofrimento
Crescimento, expansão
Brasília, mistura de gente e culturas
Recepção
Mais um recomeço!
mergulho, de cláudia zulmira
Cláudia Zulmira, nascida em 1973 em Alagoinhas (BA), reside em Brasília (DF) desde 2006. Com raízes indígenas, combina sua formação em veterinária com sua profissão bancária, dedicando-se ativamente à promoção de políticas públicas e ao desenvolvimento de projetos sociais focados em agroecologia, sociobiodiversidade e produção orgânica. Com o Sol na Casa 5, se manifesta em diversas formas de criação manual, como o cultivo de plantas, pintura de telas, xilogravura, colagem e mosaico. Além disso, canta e compõe melodias a partir de seus próprios poemas. "Mergulho" é sua obra de estreia, uma coletânea poética que reúne escritos de diferentes fases de sua vida, originalmente publicados em seu antigo blog "Tornamento-vir-a-ser".

