Leia aqui um poema de "poemas sobre o corpo, os ossos, as pedras e as tristezas", de P. Rhavel:
a ferida
trancada no silêncio, selada nas mágoas
secas feito [folhas de] outono.
o brilho opaco da minha alma perdura
as veias saltam,
componho minha urdidura
tenho um sonho, róseo e feliz em meio ao olmo
de
que
a atadura engane a ferida
ao abrir os olhos num triz
volta a realidade: me enclausura
mesmo fácil — a ilusão da qual não escapo
me prende entre o sonho e o real
no curto espaço de tempo que tenho,
(no tempo mesmo em que cerro e abro os olhos)
existo
mesmo
que
ao fim
a atadura engane a ferida
é coberta: é tudo que almejo!
é alívio, enfim.
da dor da ferida seca
(o brilho opaco da minha alma perdura)
eu já tive um coração também,
foi no mesmo triz, no espaço infinito
em
que
cerro os olhos.
ele se foi perdido na multidão
ainda me lembro, me lembro bem
disso que tive e perdi
e que deixou a ferida
certa vez tive um coração
ele batia, afinal
o ritmo ordenava a vida
corrompida em ferida
descoberta e desvelada como a verdade
sem proteção, sem atadura
então descrente
me virei como pude, me enganei como pude
as duras pedras atravessei
dizem que poesia é a alma quem fala.
há muito ela nada me diz
seca feita as folhas que [não] mencionei
infértil, estéril
escara
...
poemas sobre o corpo, os ossos, as pedras e as tristezas, de p. rhavel
Pedro Rhavel, na infância, passou uns tempos morando com a avó num lugar onde não havia luz. era um breu cheio de estrelas e vaga-lumes, cheio de cheiros inesquecíveis, sons de grilos, cigarras, e vôos, muitos voos, inclusive de mariposa. suspeita-se que foi aí que a poesia o encontrou e banhou seu espírito.