Leia aqui um poema de "primavera dos lobos", de Sofia Abrantes:
Lobos
Há uns dias atrás
Uivei na colina junto de minhas irmãs
Entre luzeiros e
damas-da-noite
Afogavam-se Lobos
[dentro de meu estômago]
Ainda vivo a brisa gélida
escorrendo gentil
na derme escoando
o assobio mediúnico
[transe]
—dentes afiados foram crescendo da cabeça de minha irmã mais nova
Ela nunca teve muita gula
Depravada de Fome,
comia seu maior mal
Sempre racionando o prato,
vira-lata insaciado
Talvez, seu erro tenha sido
pensar Quando
deveria engolir
Na irmã do meio, a mais corpulenta de nós
abriram-se olhos nas palmas;
A quiromancia substituída por
finas veias findava toda a vertigem
Mas eles choravam e
e choravam e choravam
Não suportando ela segurava pedras
enterrando os minérios
cavando nas córneas:
Só enxergava pranto
a Primogênita,
encascou a pele e
livrou-se das costelas
Uma por Uma
transmutando em arcada
ritmadas ao ventre
Tentou berrar
—a terceira mordeu
sua voz
Procurou por suporte
—a segunda furou
seus olhos
E acanhada
Ergueu-se
Pneumanou
Na colina, uivando
Tornamo-nos Lobos
Desses que não sobrevivem
no doméstico-selvagem
Fadados ao eterno pastar
Porque de carne,
só a repulsa os alimentaria.
primavera dos lobos, de sofia abrantes
Sofia Abrantes é carioca e estudante de Letras na UFRJ, onde é também pesquisadora FAPERJ da poesia de Hilda Hilst, explorando o imagético do silêncio erótico em relação ao divino. Aos 21 anos, já publicou poemas na revista Blush e na plaquete Incendiárias, pela Janela+Mapalab. Reside no Rio de Janeiro e realiza oficinas de escrita-criativa infantil na ONG Projeto Girassol.

