Leia aqui um poema de "réquiem ao futuro", de Rafael Rocca dos Santos:
Para a futura C., com amor
Não te apequenes se, envidando terrível força,
descubras que o valor devido não te vem só teu.
De início, atenta ao que o mundo te cala,
atende ao que teu íntimo absorve e exala.
Lembra que as flores aromam por uma razão,
esta talvez inacessível a teus jovens olhos;
se este outono te aventa algo de parecença estranha,
abraça-o e, com ele ao fundo, no horizonte, te guarda.
Aprecia o grão de terra, que será teu lar, mas
não te acorrenta: só a distância cresce o coração.
Frui teu templo, avoa tua intuição, traze os teus,
e deixa o demais para sem agrura gozar o longe.
Pousa na solidão. Não afasta da primavera
o teu contato. Se essas cordas que plangem hoje
algum plúmbeo pranto revelam no porvir,
que amestrem e amansem teu diálogo contigo.
Por fim, chora e ri, em igual medida:
nem toda lágrima traduz um termo.
Lembra-te que a ave revoa por uma razão:
por força ou fuga, mas nunca medo.
réquiem ao futuro, de rafael rocca dos santos
Rafael Rocca dos Santos nasceu em Poços de Caldas (MG). É tradutor, pesquisador e crítico literário. Formou-se em direito e Letras, fez mestrado em literatura comparada e teoria literária (USP) e em estudos da Shoá (OSU). Desenvolve um estudo sobre a Literatura Brasileira das duas primeiras décadas do século XX. Reside atualmente na Alemanha. É editor-chefe da revista de cultura Littera 7.

